veiga em entrevista

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Não vou perder este desafio! FOI empresário de jogadores durante 16 anos. No último Verão virou essa página. Para sempre, garante. «Nunca mais serei agente de futebolistas », diz, mesmo na eventualidade de não obter sucesso como homem forte do futebol do Benfica. Fala da sua experiência, que afirma ninguém poder negar-lhe, e de como ela pode ser útil ao clube encarnado. E mostra confiança total no título. Tornar o Benfica campeão é o seu sonho. Por isso mesmo, preparou-se para tudo e para todas as críticas. E porque sabe como funcionam «as coisas em Portugal », também está preparado para ver a sua cabeça rolar no caso de não atingir o seu objectivo. — Está arrependido de ter aceite este desafio? — Não, nada arrependido. Sou uma pessoa de desafios, preciso de desafios. Ao longo da minha vida, graças a Deus, não perdi um único desafio e não vai ser este o desafio que vou perder, com certeza. Sabia, e disse-o no início da época, que o Benfica é uma máquina trituradora, que tritura pessoas, e eu não quero deixar-me triturar por esta máquina. É fundamental que o Benfica consiga rapidamente conquistar um título para conseguir ter paz, para conseguir ter condições para as pessoas trabalharem com tranquilidade. Compreendo perfeitamente que enquanto o Benfica não for campeão não se acabará com esta tremenda ansiedade das pessoas, dos adeptos, de tudo o que rodeia o clube. — Parece muito confiante... — Claro que estou confiante. É preciso manter a serenidade, a experiência que tenho dá-me um certo traquejo. A época é muito longa e o importante é as pessoas não entrarem empânico quando há um mau resultado, importante é o grupo de trabalho estar forte e unido e acreditarmos no trabalho que é feito no dia-a-dia. Empresário nunca mais! — Se falhar o objectivo de ver o Benfica campeão, que rumo dará à sua vida? Voltará a ser empresário de jogadores? — Nunca mais. Foi uma página virada e definitivamente encerrada na minha vida. Nunca mais serei agente de jogadores. Ponto final. Não sou pessoa de meias-medidas, quando tomo uma decisão está tomada, não volto atrás. Claro que a minha vida passará sempre pelo futebol, e o futebol tem muitas áreas. Hoje estou no Benfica, amanhã não sei onde estarei; a minha vida será sempre no futebol, mas nunca mais como agente de jogadores. — Em Espanha, Itália, Inglaterra, há directores desportivos que saltam de clube em clube e ninguém se interessa por saber de que clube são, afinal, adeptos. Por cá, isso ainda não é muito bem visto. Alguma vez o será? — A nossa mentalidade é diferente e temos de aceitá-lo. Mas sou um profissional do futebol, analiso-o de uma forma fria, e para mim o que conta são os resultados; é importante que as pessoas entendam isso. Estou no Benfica para ajudar o Benfica; tenho uma certa experiência e posso com ela contribuir para o êxito do Benfica. Lidei com jogadores durante muitos anos, lidei com departamentos de futebol, com departamentos médicos, lidei com presidentes, contribuí e ajudei clubes a ser campeões... Acumulei experiência e posso ser útil ao Benfica. Ando há muitos anos no futebol, passei pelo futebol amador, semiprofissional e profissional; com 19 anos, por exemplo, era director desportivo de um clube amador que fez três competições europeias. Ninguém pode negar-me a experiência de todos estes anos a trabalhar no futebol, e por isso sinto-me convicto de que poderei ajudar o Benfica a conseguir o seu grande objectivo. Preparado para tudo — Por não ser benfiquista, há benfiquistas que continuam a vê-lo com outros olhos, maus olhos... — ... Mas não há ninguém na Terra que tenha hoje mais desejo e mais vontade do que eu de ver o Benfica campeão, absolutamente ninguém!!! Pode haver quem tenha tanta como eu, mas não há ninguém que, actualmente, sofra tanto como eu com as derrotas do Benfica e sinta tanta alegria como eu pelas vitórias. Disso pode ter a certeza. Neste momento, ninguém mais do que eu quer ver o Benfica campeão. O meu sonho é tornar o Benfica campeão. É um desafio que espero cumprir, um desafio meu e de todos aqueles que fazem parte do futebol profissional do Benfica. — Se esse desafio não for ganho é a sua cabeça que rola... — Não tenho dúvidas, especialmente sabendo como as coisas funcionam em Portugal. Há pessoas mal-intencionadas, outras ignorantes, cujo objectivo é dizer mal, criticar por criticar, e destruir. Estando na posição em que estou, tenho de estar preparado para tudo. — Mas sente-se mal amado entre os adeptos do Benfica? — De modo algum. Ao contrário do que muitos possam pensar, tenho sentido um carinho enorme por parte dos adeptos do Benfica, tenho sido acarinhado de uma forma espectacular. — Se conseguir ser campeão no Benfica, essa será a sua maior alegria no futebol? — Será certamente um dos grandes momentos. Mas prefiro aguardar pelo final e responder nessa altura. Estaria preocupado, sim, se fosse dirigente do FC Porto ou do Sporting! José Veiga, 41 anos, casado e pai de dois filhos. Já foi muita coisa na vida e de vida leva já muitos anos no futebol, 23 desde que começou como director de um clube amador, no Luxemburgo. Não é um personagem polémico mas tem suscitado polémica, sobretudo desde que foi convidado pelo presidente do Benfica para tomar conta do futebol da Luz. Gosta pouco de dar entrevistas e por isso talvez se contem pelos dedos de uma só mão as vezes em que apareceu nos jornais a falar em mais de uma página. A BOLA desafiou-o a quebrar o silêncio que mantinha desde há muito e colocou-o perante a maioria das questões mais actuais do futebol benfiquista. O resultado é o espelho de um homem intransigente mas muito optimista. José Veiga, 41 anos, um apaixonado pelo futebol, cidadão português ainda com muito espírito de emigrante, que gosta de sair de casa antes das oito da manhã e de regressar antes da meia-noite, confessa nestas páginas o que muitos parecem ainda pôr em dúvida: está no Benfica para ser campeão e por isso quase todos os dias é o primeiro a chegar à Luz e quase todos os dias o último a sair. Das suas palavras vai o leitor tirar as suas conclusões, sendo certo que estamos perante um homem muito determinado, motivado, optimista, aqui e ali inflexível, também compreensivo, cheio de fé, um líder confiante no seu grupo mas intransigente com as regras, a disciplina e o objectivo do seu trabalho. A entrevista segue pelas páginas seguintes. — Está preocupado com a situação actual do Benfica? — Não. Estou perfeitamente tranquilo. Tenho consciência de que temos feito um bom trabalho desde o início da época e de que os objectivos que foram traçados no princípio do ano estão intactos, todos eles. Estamos nas três frentes; na SuperLiga estamos a um ponto do primeiro classificado, atingimos os oitavos-de-final da Taça UEFA e chegámos aos dezasseis-avos da Taça de Portugal. Estou, portanto, muito satisfeito com o trabalho que tem sido feito e com todo o grupo de trabalho. Benfica colado aos adversários — A última imagem do Benfica, nesta fase final do ano, aquela que está na memória das pessoas, é a de uma equipa que não tem jogado muito bem, que tem oscilado demasiado. Essa foi apenas uma má fase e já passou, ou teme que ela ainda se prolongue? — Foi uma má fase. Mas as pessoas devem ter a memória curta. Só uma pessoa mal-intencionada ou distraída é que não analisa e não vê as dificuldades por que o Benfica passou ao longo destes últimos meses. Tivemos lesões inexplicáveis, e não estou a falar de lesões musculares, lesões musculares houve muito poucas, estou a falar de lesões inexplicáveis, até de jogadores que se lesionaram sozinhos. Independentemente de todos os jogadores serem importantes, a verdade é que de repente a equipa deixou de poder contar com jogadores reconhecidamente nucleares. De repente, e dou apenas exemplos, ficámos sem o Miguel, sem o Ricardo Rocha, sem o Luisão, sem o Petit, sem o Nuno Gomes, e alguns outros jogadores, e a equipa não podia deixar de se ressentir, esta ou qualquer outra que tivesse sofrido algo semelhante. Tivemos realmente uma série de dificuldades mas penso que já passámos essa fase. De momento, a maior preocupação é recuperar todos os jogadores para reiniciarmos o campeonato nas melhores condições, e penso que vamos consegui-lo. Como disse de início, sinceramente não estou preocupado; estaria preocupado se fosse dirigente do FC Porto ou do Sporting, porque a verdade é que, mesmo com a má fase que vivemos, com tantas lesões, estamos apenas a um ponto do FC Porto e em igualdade com o Sporting, portanto, só estaria preocupado se fosse dirigente desses clubes. Apesar de todas as dificuldades conseguimos estar colados aos nossos principais adversários. O trabalho com Trapattoni — Quer dizer que estar a um ponto do líder o satisfaz? — Concluir o ano a um ponto do líder não pode deixar de satisfazer. Com um orçamento igual ao do líder, eu teria obrigação de estar destacado no primeiro lugar para aí com 10 ou 12 pontos de avanço. O que significa que no lugar dele eu estaria preocupado. Agora com o orçamento que nós temos e com as dificuldades que tivemos nesta primeira fase, estar a um ponto do líder, e estar nas outras duas frentes, é algo de francamente positivo. É por isso que não posso deixar de estar satisfeito e de salientar o trabalho dos jogadores, da equipa técnica e da equipa médica. — Ainda mantém hoje exactamente a mesma opinião que o levou a contratar Giovanni Trapattoni? — Mantenho-a em absoluto. Todos nós devemos aprender, e aprendemos todos os dias, com Giovanni Trapattoni. Para um dirigente, jogador, ou para qualquer elemento ligado ao futebol, trabalhar hoje com Giovanni Trapattoni é o máximo. Trapattoni é um gentleman em todos os sentidos, é um grandíssimo profissional, é um autêntico professor, é um treinador com um currículo impressionante, e que não deixa de revelar uma humildade invejável e uma forma simples de lidar com as pessoas. Trapattoni é um profissional que trabalha para o Benfica de manhã à noite, que assume uma disponibilidade e dedicação totais, é um homem com quem se pode trabalhar permanentemente em equipa, com quem se pode conversar, e, repito, que está sempre pronto, a qualquer hora, em qualquer momento, para falar e para trabalhar para o Benfica. — Ele é um treinador exigente? — É! Muito exigente, disciplinado, é um treinador que tem as suas regras e exige vê-las respeitadas. Para uma equipa vencer é preciso realmente rigor, é preciso impor regras, e quem não tencionar cumprir essas regras não pode estar num clube como o Benfica. A organização do futebol do Benfica tem de ser intransigente com as regras que impõe a si própria. — Pergunto se exige muito aos dirigentes... Exige-lhe muito a si? — Não. Ele exige aquilo que é normal um treinador exigir. Exige condições de trabalho, e penso que hoje em dia o Benfica tem excelentes condições de trabalho. É a única coisa que ele exige à Direcção. De resto, há uma estrutura sempre muito próxima do treinador, e portanto qualquer coisa que seja necessária é rapidamente resolvida, porque estamos constantemente em contacto. É um privilégio estar a trabalhar com um treinador como Giovanni Trapattoni. O treinador e a realidade do clube — Foi Trapattoni quem exigiu reforços? — Não. Repare, ele, eu, o presidente, conversamos, analisamos, fazemos o diagnóstico das situações; sabemos perfeitamente que temos de resolver uma ou outra situação e isso é perfeitamente natural. O Benfica tem hoje um grupo forte. Já o disse mais do que uma vez: este plantel tem qualidade, e quando digo que tem qualidade não o digo só por dizer, nem para ser simpático para o balneário; acho sinceramente que tem qualidade. No entanto, é natural que este grupo tenha de ser retocado com um ou outro jogador, o que vamos fazer, de acordo com o treinador, sempre em sintonia com o treinador. Poucas, muito poucas equipas não se reforçam nesta altura. No nosso caso, estamos a falar de reforços que visam tornar o conjunto mais forte, não estamos a falar da importância das individualidades, estamos a falar de tornar o plantel mais forte. Estamos a falar de equilibrar o conjunto, porque o Benfica vale, e tem de valer, pelo seu conjunto e não pelas suas individualidades. — Trapattoni é um treinador que se dá por satisfeito com o que tem, é isso? — Não. O que acontece é que, ao contrário de outros treinadores, de outros até que já passaram pelo Benfica, Trapattoni é um técnico muito experiente, que procurou conhecer a realidade do clube, que sabe as dificuldades que o Benfica tem, que sabe que o Benfica não nada em dinheiro. Por isso, está em perfeita sintonia com a SAD, e em sintonia com aquilo que é possível obter, com aquilo que é possível contratar e o que não é possível. Só com um treinador assim é possível ganhar estabilidade nas relações e no trabalho. — Com tantas dificuldades financeiras, como é afinal possível reforçar a equipa? — Só é possível devido a algumas engenharias financeiras, pela obtenção de parcerias, trabalhando com fundos de investimento, enfim, usando estratégias que hoje fazem parte deste negócio do futebol. A SAD do Benfica tem de cumprir rigorosamente um orçamento e não dispõe de um orçamento como alguns dos nossos adversários. Se o tivéssemos provavelmente não estaríamos com este número de pontos e neste lugar no campeonato. Sabemos que não podemos alterar o nosso orçamento, sabemos à partida que não dispomos de um euro para contratar jogadores ou para pagar empréstimos, por isso temos de recorrer a outro tipo de soluções. Só assim será possível reforçar a equipa. Mas, por isso mesmo, temos de aguardar o desfecho de todas as negociações. — Sem desequilibrar o orçamento? — Sem desequilibrar o orçamento. Ser campeão com... orçamento menor — É possível ser campeão num clube com um orçamento que representa menos de metade, por exemplo, do orçamento do FC Porto? — Não só é possível como acredito que vamos consegui-lo. Claro que o Benfica tem contra si o facto de não ganhar o campeonato há 10 anos, claro que talvez seja mais difícil no Benfica do que em clubes que dispõem de meios financeiros muitos superiores, mas acredito firmemente desde o primeiro dia e não alterei minimamente aquilo em que acredito. No futebol do Benfica, no balneário, sabe-se perfeitamente que o objectivo traçado é o de ser campeão; essa vontade existe, o grupo está empenhado nesse objectivo, e todos acreditam poder conquistar o título. Se não ganharmos será para mim uma desilusão muito, muito grande. — É essa fé que o levou a determinar que os jogadores só terão prémio no caso de vitória no campeonato? — Num clube como o Benfica, pela sua grandeza e pelo seu passado, só pode haver um objectivo: ser campeão! O segundo lugar é um péssimo lugar. No futebol do Benfica ninguém pode contentar-se com o segundo lugar, nem jogadores, nem técnicos, nem equipa médica, nem restantes elementos; ninguém pode ficar satisfeito se ficar em segundo lugar. No Benfica, as pessoas têm de se convencer de que o objectivo é o primeiro lugar e não faz sentido pagar prémios por qualquer outra classificação. Isso foi estabelecido de acordo com o próprio grupo de trabalho. Há, pois, que reconhecer que todos, mas todos, jogadores, técnicos, departamento médico, aceitaram este desafio, e aceitaram-no com enorme ambição, profissionalismo e empenho. Não deixo por isso de salientar, nessa medida, o comportamento dos jogadores ao manifestarem total concordância com esta decisão. O «derby» e o livro de Camacho — O que espera do Sporting-Benfica? — Espero um grande jogo de futebol entre duas grandes equipas e espero ver o Benfica determinado a vencer. Só a vitória nos interessa. — E qual é a sua opinião sobre a apresentação do livro de José Antonio Camacho em pleno Estádio da Luz, a quatro dias do derby em Alvalade? — Sobre isso, palavras para quê? Sem comentários. Enfim... — Porque não tomou posse como administrador da SAD? — Tomei iniciativa de falar com o presidente e de lhe pedir para não tomar posse enquanto não resolver alguns assuntos da minha vida particular. — É accionista da SAD? — Sou. Pinto da Costa arguido não me surpreende — O que espera do Apito Dourado? — Espero que contribua para uma mudança no futebol português. Mas vamos aguardar pelo desenvolvimento do processo. — Como viu o facto de o presidente do FC Porto ter sido constituído arguido neste processo de investigação? — Como pessoa que está há tantos anos no futebol, não me surpreende. Não me surpreende nada. Mas vamos aguardar, decorre uma investigação e devemos deixar que as autoridades cumpram a sua missão. Nunca tive problemas com Ricardo Rocha O Benfica vai reforçar-se, essa é garantia absoluta de José Veiga, mesmo não podendo ainda divulgar nomes. Fala no entanto dos reforços que vieram no princípio da época, das notícias que dão Ricardo Rocha no FC Porto, da transferência de Tiago e da muita vontade que teve em contratar o brasileiro Robinho... — Ir ao mercado agora é fundamental para o Benfica? — É fundamental para o Benfica como o é para a maior parte dos clubes. Praticamente todos os clubes se reforçam no mês de Janeiro, por isso é que há esta segunda fase de mercado. E os reforços que vamos garantir são naturalmente importantes para o Benfica porque vêm dar muito mais qualidade ao próprio conjunto, porque se constituem como mais e melhores soluções no plantel. E é isso que é importante, valorizar o conjunto. — Quando espera ter esses reforços? — Dentro de pouco tempo. É o que posso dizer. — E vão sair jogadores? — Estamos a analisar a situação. Importante é não corrermos riscos na fase mais exigente do campeonato, e falo pela experiência que tenho no futebol. Temos de tomar medidas e algumas delas estão tomadas. Compreendo que possam ser desagradáveis, mas serão medidas tomadas conscientemente, para benefício do grupo de trabalho e dos objectivos do Benfica. A seu tempo daremos a conhecê-las. — Queria muito ter Robinho? — Queríamos e é público que tentámos tudo para o contratar. Tínhamos condições para o adquirir, mas não podemos obrigar um presidente de um clube a vender, como não nos obrigaram a vender os nossos jogadores no início da época, e até mesmo agora, que fomos sondados por alguns clubes para vendermos alguns jogadores e não aceitámos as propostas. O presidente do Santos também está empenhado em não aceitar nenhuma proposta porque quer o Robinho até ao final de Junho. E temos de aceitar essa decisão. Karadas, Dos Santos... — Pode ser acusado de ter constituído um plantel desequilibrado? — Muito do que o Benfica faz está sempre errado, é pelo menos assim que a crítica, ou grande parte da crítica, vê o Benfica. As pessoas devem entender que o Benfica tem um orçamento e tem de cumpri-lo rigorosamente. Não temos os milhões que outros tiveram para investir. Importante era que alguém fizesse essa análise, como é que se gastam tantos milhões para afinal ter, para já, tão pouco retorno de resultados no campeonato. Temos um orçamento rigoroso e fomos contratar jogadores enquadrados nesse orçamento, foi aquilo que fomos capazes. Mas analisemos: contratámos o Karadas e penso que é um bom investimento, é um jovem com 22 anos, com margem de progressão muito grande, que vem de um país com um futebol totalmente diferente do que se joga aqui, no Sul da Europa; ainda por cima, ele praticamente não descansou, porque o campeonato norueguês não pára no Verão. Dos Santos é um jogador que tem cumprido sempre que chamado à equipa, um jogador experiente. Aliás, pergunto quem em Portugal tem melhores laterais-esquerdos que o Benfica? Alguma equipa tem melhor dupla que Dos Santos-Fyssas? Não vejo ninguém com dois laterais-esquerdos como estes. Quanto ao Quim, penso que dispensa apresentações, ele é apenas o guarda-redes número dois da Selecção. O Everson... repare, se as pessoas tiverem o cuidado de se informar, e não é preciso ir muito longe porque Nice, em França, é quase aqui ao lado, se forem pedir informações sobre os últimos dois anos do Everson vão perceber que ele foi um dos principais responsáveis pelas boas carreiras da equipa e foi sempre considerado dos melhores estrangeiros no futebol francês; conhecerão assim a qualidade do jogador. Ele ainda não pôde mostrar entre nós tudo aquilo que sabe, mas pensamos que muito em breve vai ter essa possibilidade. A verdade é que, mesmo com algumas dificuldades, mesmo físicas, por causa de uma hérnia inguinal, ele esteve sempre disponível para ajudar a equipa. Paulo Almeida, Luisão... — E Paulo Almeida? Foi um erro contratá-lo? É verdade que foi um jogador indicado por Camacho? — Foi contratado na era-Camacho. Sim, foi ele quem o indicou. O Benfica contratou o Paulo Almeida seis meses antes do final da última época, porque ele terminava contrato. Mas é preciso ter calma, dar algum tempo a Paulo Almeida para ele se adaptar, para ele se integrar. Não esquecer que Paulo Almeida foi o mais jovem capitão da história do Santos, um jogador titularíssimo, campeão brasileiro, um jogador que fez todas as selecções do Brasil, junto de jogadores como Diego, Robinho, Luisão, e de outros jogadores de renome; acho que devemos dar algum tempo ao Paulo Almeida, há jogadores que necessitam sempre de mais algum tempo de adaptação do que outros. Veja-se o caso do Luisão, que sentiu algumas dificuldades quando chegou e hoje em dia parece reconhecido como um dos melhores centrais da Europa. E como diz o nosso presidente, quando o Luisão chegou também diziam que tínhamos contratado um basquetebolista e hoje em dia ele é fundamental no Benfica. — E Luisão sairá mesmo no final da época? — Ainda é cedo para fazer avaliações. Fizemos um esforço tremendo de, à excepção de Tiago, não vender qualquer outro jogador, e penso que esse foi o grande reforço do Benfica, ter mantido a generalidade dos jogadores nucleares, dos jogadores-base, digamos. Também não vamos vender qualquer desses jogadores nesta fase de mercado e, à partida, não tencionamos vender no final da época, porque pensamos que é fundamental que o Benfica consiga estabilizar uma boa equipa. A venda de Tiago — Teve problemas com Ricardo Rocha? — Não. Tenho uma relação fantástica com ele. Estamos muito satisfeitos com o desempenho dele, tanto profissional como humano. O Ricardo é um jogador de grande carácter, que se enquadra perfeitamente naquilo que o Benfica quer para o futuro. — Como tem visto as notícias que dão Ricardo Rocha no FC Porto no final desta época? — O Ricardo Rocha tem mais dois anos e meio de contrato com o Benfica. Estamos, portanto, perfeitamente tranquilos. Foi, aliás, o próprio Ricardo Rocha que se encarregou de falar comigo sobre essas notícias e mostrar a sua indignação. Estou tranquilo e consciente sobre a situação do Ricardo Rocha. Mas sei, e estamos preparados para isso, que vamos ser alvo de alguma desestabilização com notícias desse tipo, sobretudo nos tempos mais próximos. Sabemos qual é a origem dessas provocações. — E com o Tiago chegou a ter algum problema? — Não, nunca. O Tiago foi vendido porque houve uma proposta irrecusável do Chelsea e foi um excelente negócio para o Benfica. Pergunto quantos negócios o Benfica fez como o de Tiago, transferido por 12,5 milhões de euros? Se no passado o Benfica teve muitas transferências dessas gostaria que mas mostrassem. — Foi uma opção ou simples necessidade de reduzir custos? — Foi uma opção. Não é preciso muita gente. É preciso é que as pessoas que estão no futebol do Benfica tenham disponibilidade total, 24 sobre 24 horas, para trabalhar. Não sei como se trabalhava no passado nem estou muito interessado em saber, mas as pessoas que hoje estão comigo têmde estar preparadas para trabalhar 24 sobre 24 horas; não há part-times, não há meias tintas. É mais importante ter pouca gente que trabalhe de manhã, à noite, de madrugada, do que ter muita gente e fazer pouco. Quem não tiver esse pensamento, quem não tiver essa disponibilidade, não pode estar no Benfica, não pode fazer parte deste grupo de trabalho; e isto diz respeito às pessoas que estão mais directamente a trabalhar comigo, como diz respeito aos jogadores, técnicos e corpo clínico. Diz respeito a todos sem excepção. — No futebol do Benfica as decisões passam exclusivamente por si? — Por mim, pelo presidente, pela SAD. Tenho uma relação fantástica com o presidente. Além disso, e nunca é de mais dizê-lo, pormuito que custe a algumas pessoas, tudo o que Luís Filipe Vieira tem feito merece o nosso respeito e a nossa admiração. Não é estara dizer por dizer, eu sei do que estou a falar. O presidente do Benfica merece realmente uma estátua por tudo o que tem feito, e afinal em tão pouco tempo; ele conseguiu dar ao clube total credibilidade nomercado financeiro e no mercado desportivo; hoje, o Benfica é de novo respeitado em todo o lado, o que não acontecia no passado, e isso deve-se apenas a um homem: Luís Filipe Vieira. Autonomia indispensável — Mas você tem autonomia no futebol? — Tenho a autonomia necessária àquilo que preciso de fazer no dia-a-dia. Mas todas as decisões de fundo são tomadas em conjunto com o presidente e com os restantes elementos do Conselho de Administração da SAD. É um Conselho de Administração coeso, que também não tem horas para trabalhar, de uma disponibilidade total e de grande dedicação; e a SAD conta com grandes profissionais nas várias áreas. — Como é o seu dia-a-dia no Benfica? — O meu dia-a-dia? É ser praticamente o primeiro a chegar à Luz e praticamente o último a sair. Como disse há pouco, é muito mais difícil trabalhar no Benfica do que em outros clubes, por isso mesmo aqui tenho de trabalhar provavelmente mais do que teria se estivesse noutro clube. No Benfica, hoje, é fundamental estar-se de manhã à noite. O nosso ponto forte é o espírito no balneário REVISITADO o Benfica-FC Porto e analisados alguns maus resultados da equipa, José Veiga diz que voltaria a repetir tudo o que fez no final do clássico da Luz à excepção de uma coisa: «Teria impedido o presidente do FC Porto de entrar na nossa sala de imprensa.» — Em sua opinião, que resultados esta época podem ser considerados maus resultados? — Considero que o 3-0 em Estugarda, para a Taça UEFA, foi um mau resultado. Em Estugarda, a equipa até entrou muito bem no jogo, e depois, a partir do primeiro golo, sentiu dificuldades. O 3-3 como Rio Ave, na Luz, também; o Benfica esteve a ganhar por 2-0 e é incompreensível como a equipa se deixou depois empatar; outro mau resultado foi em Belém. Aquela derrota por 4-1 foi um resultado anormal, num jogo também um pouco anormal, no qual a equipa sofreu três golos em10minutos. Considero, portanto, esses três como os maus resultados da equipa numa fase difícil. Mas, entretanto, conseguimos também bons resultados noutros campos. Vamos ver... Depois da recuperação de todos os lesionados, com outra estabilidade no plantel, acredito que faremos uma segunda volta de campeonato, digamos, de acordo com o nosso desejo e com toda a nossa vontade, de modo a chegarmos ao título. Importante é que todas as pessoas, sócios e simpatizantes, acreditem que podemos lá chegar. Dentro do grupo de trabalho, dentro do balneário, aí não tenho qualquer dúvida de que só há um pensamento: atingir o objectivo. — Os jogadores acreditam mesmo? —Tenho a certeza. Neste momento, o ponto forte do Benfica é realmente o seu balneário. Estou mesmo convencido de que essa é uma vantagem sobre alguns dos nossos adversários. Existe uma forte união dentro do balneário do Benfica; há regras mas há uma união muito forte e há aquele espírito de que quem cumprir essas regras é bem-vindo, é aceite, fantástico, e de que quem não cumprir não pode fazer parte daquele grupo de trabalho, não pode fazer parte do Benfica. Hoje em dia, sejam atletas, seja qualquer elemento do grupo de trabalho do futebol, todos têm que pensar no Benfica 24 sobre 24 horas; quem não tiver esse pensamento não pode fazer parte deste grupo. Grandeza para o bem e para o mal — Acha que as críticas têm sido demasiado severas? — Julgo que algumas críticas têm sido realmente severas e de certo modo injustas. Mas o problema é que o Benfica é grande nos momentos de glória e é igualmente grande quando se trata de o atacar, é um clube com as costas largas, alvo apetecível para toda a gente. Se analisarmos a forma como muitas críticas têm sido feitas é fácil detectarmos injustiças, sobretudo quando comparadas as situações com as de outros clubes. Erros cometidos noutros clubes não atingem, nem de perto nem de longe, a expressão de qualquer coisa que aconteça no Benfica. O que acontece nesses clubes não é criticado, escrito ou analisado da mesma maneira. Tudo o que sucede no Benfica tem uma amplificação enorme... — ... À imagem da grandeza do clube... — ... É verdade, e é também por isso que costumo dizer que trabalhar no Benfica é muito mais difícil do que em qualquer outro clube português. — Está a lamentar-se? — Não, apenas a constatar uma realidade. No Benfica, qualquer palavra mal proferida ganha uma importância enorme, o mínimo erro é alvo de análises e comentários à lupa, nada comparável ao que se vive nos outros clubes, o Benfica é demasiado grande para o bom e para o mau, mas temos de saber viver com isso. Repito é que é muito mais difícil trabalhar no Benfica, ganhar alguma coisa no Benfica, do que noutro clube. Sacrifício de Everson — Mas não lhe parecem algumas críticas amplamente justificadas? Um exemplo: faz algum sentido levar o Everson para o banco no jogo com o Belenenses e submetê-lo a uma operação logo a seguir? — Faz sentido para quem esteve por dentro da realidade. Vivíamos uma fase muito difícil, naquela altura o treinador não tinha praticamente mais jogadores, podia recorrer, como recorreu, a jogadores da equipa B, mas sabíamos que era importante pedir um sacrifício a Everson para o caso de ele vir a ser absolutamente indispensável, daí termos adiado a sua operação. No Restelo, se fosse necessário jogar alguns minutos, o Everson estava disposto a fazê-lo, mesmo sacrificando-se um pouco. É por essas e por outras que quando afirmo que este grupo do Benfica tem muita qualidade, digo que tem mesmo muita qualidade, quer desportiva, quer humana. — ... — É um grupo que tem carácter, que está com uma disposição enorme para lutar firmemente até à última gota de suor para poder conquistar o objectivo que foi traçado no princípio da época. É importante que as pessoas, nos momentos mais difíceis, consigam ter calma, consigam ter serenidade para que não se destrua o bom que existe. É importante que o Benfica aprenda com os erros cometidos nos últimos anos, com as constantes decisões de destruir tudo sempre que algo corria mal, triturando treinadores e jogadores e partindo sistematicamente quase do zero. Hoje, há muita coisa bem feita, há muita coisa positiva dentro deste grupo de trabalho e é importante que as pessoas o preservem e apoiem. — Mas situações como a de Everson não podem deixar de ser comentadas, suscitam dúvidas legítimas nos adeptos... — Muito bem. Mas o que disseram de situações semelhantes vividas noutros clubes? De jogadores que mal são contratados têm de ser operados?... — Está a referir-se a quem? Ao novo jogador do FC Porto, Leandro? —... Um jogador que penso ter custado 2,5 milhões de euros, segundo a comunicação social, e antes de ser apresentado é operado. Não vi em lado algum críticas que pudessem colocar em causa a qualidade do jogador. Já para não relembrar outras situações vividas noutros clubes, de jogadores contratados que nem sequer vestem a camisola e são logo emprestados ou vendidos, ou dados gratuitamente, ou trocados por outros, sem que ninguém ponha isso em causa, sem que ninguém aponte qualquer crítica. Se fosse no Benfica, imagine... «A FIFA viu» — Qual foi a sua maior desilusão até agora? — O Benfica-FC Porto e a forma como perdemos. E mesmo que algumas pessoas tenham tentado esconder a verdade com uma peneira, ficou pelo menos provado que se passaram coisas graves. Como ficou, aliás, reconhecido pela própria FIFA, algo que muita gente não quis ver em Portugal e a FIFA viu, e por isso tomou a decisão de excluir do grupo de juízes internacionais portugueses um dos árbitros auxiliares desse Benfica-FC Porto. — Aquelas cenas na sala de imprensa do Estádio da Luz, no final do jogo, podiam ter sido evitadas ou, se voltasse atrás, faria a mesma coisa? — Acho que fiz exactamente o que devia ter feito, porque devia manifestar a minha revolta por aquilo que vi, por aquilo a que assisti. A única coisa que faria hoje e que não fiz era ter impedido o presidente do FC Porto de entrar na sala de imprensa do Estádio da Luz. O Benfica é muito grande e tem muitas portas... mas teria arranjado maneira de impedir aquelas pessoas de entrar, porque aquela é a nossa casa, e portanto só deve entrar quem nós entendemos que pode entrar.