Atletismo - João Ferreira em entrevista: «O futuro é complicado»

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http://www.slbenfica.pt
Apesar de ter sido a modalidade do Benfica que mais títulos conquistou esta temporada, o Atletismo atravessa uma das maiores «crises» da sua história. Com quase 98 anos de vida e mais de quatro mil títulos (entre colectivos, individuais, em provas nacionais e regionais) no seu palmarés, encontra-se sem verbas para preparar a época que se avizinha. O responsável da Secção não está disposto a desistir mas perspectiva um cenário «negro» para os tempos mais próximos, caso não apareçam soluções credíveis. Como é que antevê o futuro do Atletismo no Benfica? O futuro próximo do Atletismo do Benfica é complicado, se não houver um conjunto de boas vontades. Sabemos que temos um projecto, sabemos o que queremos e o que queríamos era continuar a apostar na formação, sempre com as referências. O que queríamos era viabilizar o Atletismo nos próximos anos, através de jovens que tivessem algum tempo de Benfica, mas a situação actual do Clube (depois da última Assembleia Geral, com a aprovação do Orçamento), deixa-nos um tanto ou quanto numa posição delicada, porque o Orçamento para o Atletismo é zero e portanto, provavelmente, vamos ter de abortar este projecto. Isso implicaria a saída de grandes atletas que fazem parte da actual equipa? Se não tivermos apoios ou patrocínios, sejam de benfiquistas ou de empresas, não será possível continuar com o projecto. E é com alguma dor nossa e com dificuldade que terei de aceitar que alguns atletas nossos, que sendo ainda Juniores, estejam há oito ou nove anos no Clube e que eu agora lhes diga “adeus, porque isto não tem viabilidade”. Ou atletas do nível de um Nelson Évora e das outras figuras a quem se tem de dizer adeus. Estes são atletas importantes do desporto português e só é pena o Benfica tenha de deixar de usufruir do seu talento. O que é necessário para evitar essa situação? No futuro, se não tivermos ajuda, seja das Casas do Benfica espalhadas pelo mundo, seja de benfiquistas que tenham possibilidades de investir, seja a nível particular ou empresarial, não teremos possibilidades de continuar. Se até 15 de Setembro não arranjarmos 40 mil euros esta é a realidade, porque o Atletismo define-se entre 15 de Setembro e 15 de Outubro e a realidade é que hoje temos zero. Qual é o balanço que faz neste momento? A situação actual é ainda mais grave porque apesar de algumas promessas de ajudas não houve a concretização dessas mesmas promessas. O ano passado lamentei que houvesse uma pessoa que havia prometido disponibilizar uma verba mensal à Secção e que nunca cumpriu. Infelizmente voltei a confiar na mesma pessoa para pagar os subsídios ao Carlos Silva, que também não cumpriu, criando um problema ao atleta e ao próprio clube que teve de assumir o pagamento desse valor. Essa pessoa é o dr. Pedro Brito Mena Antunes, que por duas vezes seguidas não cumpriu a sua promessa. Percebemos a crise a situação por que passam as empresas e as próprias pessoas mas julgamos que os compromissos são para se honrar, ou pelo menos para tentar honrar. A viabilidade do Atletismo só poderá passar por pessoas que realmente acreditem que nós podemos fazer algo, tanto pela modalidade como pelo clube – como penso que provámos este ano – e que consigam honrar os acordos feitos. Esta é uma situação inimaginável para uma modalidade com um imenso palmarés… O Atletismo do Benfica tem 98 anos. O Atletismo tem imensos títulos nacionais e tem dezenas de atletas olímpicos. O Atletismo do Benfica tem a única medalha olímpica da história do clube. Infelizmente isto é o Atletismo, ou seja, não é o Atletismo do Benfica que não tem visibilidade, é o Atletismo em Portugal que não tem visibilidade. Não há televisão no Atletismo, não há páginas de jornal sobre o Atletismo e esta é a razão pela qual os sócios conhecerão menos bem o que é o Atletismo do Benfica e o Atletismo em geral. Mas são estes títulos e estes 98 anos de história que me levam a custar de dizer que desisto, porque acho que é uma falta de respeito com Francisco Lázaro, Matos Fernandes, Tomás Paquete, José Carvalho, Pedro Rodrigues, Mário Aníbal, Carlos Silva, António Leitão, José Regalo, António Pinto, entre tantos outros. As suas palavras deixam antever que não vai desistir? Deitarmos a toalha ao chão acho que é uma falta de respeito por todos estes e muitos mais, que durante muitos anos deram o seu melhor e contribuíram também para o engrandecimento do nome do Benfica. Não nos podemos esquecer desta história, porque se em outras modalidades nós apelamos à história, também no Atletismo isso não pode ser esquecido. Mais que não seja em honra de tudo isto não podemos fechar a Secção. Compreendemos que o momento do clube é difícil, mas com alguma boa vontade das Casas do Benfica no estrangeiro, e de alguns sócios poderá ser possível. Projecto do Atletismo Qual é a estratégia para garantir mais estabilidade no Atletismo? O projecto continuará a basear-se na formação. Primeiro temos de definir se vamos ter espaço próprio ou não. Se vamos continuar a trabalhar no Estádio Universitário ou se é criado um espaço nosso (no Estádio da Luz ou noutro local). Em princípio, e pelo que sabemos, a Direcção está a trabalhar nesse sentido. Depois, seja onde for, basear o nosso trabalho de formação em escolas próximas do local de treino. Fazer campanhas aí no sentido de trazer jovens para o Atletismo do Benfica. O segundo passo será manter estes jovens atletas que foram campeões este ano, porque na sua maioria são atletas de 1.º ano que ainda podem competir mais algum tempo nestes escalões. Haverá desta forma uma garantia de continuidade, que com as tais figuras, dentro de três a quatro anos, termos uma equipa boa, alicerçada em atletas que já tenham algum passado no Clube. E esse projecto prevê a luta pelos primeiros lugares? Falar em títulos não é fácil, ou seja, eu não posso dizer que se tiver as condições mínimas vamos ser campeões. O que eu posso dizer é que, a continuar com estes atletas e com os actuais valores de 50 mil euros/ano, nos próximos dois ou três anos, temos uma garantia muito maior de continuarmos a ser campeões de Juvenis e de Juniores. E para que essa qualidade não se perca há que criar o «alimento». E esse «alimento» pode ir-se buscar às escolas, criando um núcleo de aprendizagem do Atletismo. Porque ninguém pode pensar em ser campeões de Seniores com 50 mil euros, e ainda assim chegámos ao pódio em duas competições. O que é que tem sido feito para tornar possível a implementação dessa ideia? Continuamos a trabalhar no sentido de organizar eventos que viabilizem não só esta situação mas que viabilizem o passo a seguir, a tal equipa competitiva. É óbvio que isto não pode ser organizado a um ano, e não só necessitamos de patrocínios para esses eventos como também um envolvimento do próprio clube, no sentido de apoiar institucionalmente, com a sua força, para dar um maior impulso a este projecto.