Gosto dos assobios

Fonte
DN
Entrevista Zahovic Ex-jogador do Benfica «Jogo de Bruxelas marcou o fim do meu ciclo na Luz» Chegou ao Benfica em 2001 pela mão de Vieira. Agora rescindiu por sentir que já não era opção. Garante que leva mágoas, mas continua sem entender umas decisões do técnico Sílvia Freches DN-Leonardo Negrão Elogios. Zahovic quer regressar à Luz para receber faixa de campeão A rescisão com o Benfica significa um adeus à carreira de jogador? A minha carreira não vai acabar aqui. Sinto-me bem, acho que posso jogar mais um ou dois anos. No futebol português? Em princípio, não. Quando se joga em três grandes clubes, como Guimarães, FC Porto e Benfica, é muito difícil mudar para um mais modesto. Passei dez anos fabulosos em Portugal, agora sinto que o melhor é mudar de ares, para ter outras motivações, conhecer novas mentalidades. E depois pretende voltar, ou Portugal já é passado? Portugal nunca pode ser passado para mim, cá nasceram os meus filhos, e quase tudo o que consegui na minha vida devo-o aos portugueses, aos clubes, às instituições, às pessoas em geral. Jogou no Guimarães, FC Porto e Benfica, qual o clube que o marcou mais? Foram fases distintas na minha carreira, e nesses momentos todos foram importantes. Senti-me bem nos três clubes. Por todos disputei grandes derbies, mesmo em Guimarães, que na altura lutava sempre pela Europa, e senti sempre a mesma paixão e emoção. Em qualquer destes clubes ganhei sempre mais do que perdi. E qual foi o presidente que o tratou melhor? O presidente de um clube não tem que ter uma relação muito próxima com os jogadores. Cada um no seu lugar. Comigo foi sempre assim. Ti-ve bom relacionamento com quase todos os presidentes, menos com Pimenta Machado, mas ele sabe porquê, isso sim é passado. Saiu do FC Porto com relações cortadas com Pinto da Costa? Não, pelo contrário. Sempre tive o melhor relacionamento com Pinto da Costa. Quando saí, o presidente defendeu os interesses do clube e eu defendi os meus. Mas o seu ingresso no Benfica foi considerado uma traição... Se fosse português e vivesse com uma cor no meu coração poderiam falar assim. Mas eu vim de outro país e sou profissional, não posso pensar com o coração. Falando de coração, de qual clube português se sente mais próximo? O que eu me sinto é um privilegiado, porque representei os dois maiores clubes portugueses. E agora, no próximo clássico entre Benfica e FC Porto, por qual torceria? Pelo Benfica, claro. Quero ser campeão pelo Benfica, quero receber a faixa no final deste campeonato. Acredita neste plantel do Benfica, mesmo que não tenha reforços? Acredito e desejo. Temos o melhor plantel da liga portuguesa, todos os jogadores são do mais profissional que há. Se todos estiverem com saúde é difícil ganhar a este Benfica. O problema é que têm surgido muitas lesões, e não é só esta época. A equipa, ao contrário do que alguns dizem, tem valor e mentalidade ganhadora, mas tem tido azar. Quer dizer que este plantel não necessita de reforços? [Silêncio] Depois do jogo de Bruxelas passou a precisar... Mais do que jogadores para determinados sectores, a equipa necessita de reforçar a parte psicológica. E foi porque não se sentir bem psicologicamente que decidiu sair ? Foi, sobretudo, porque achei que mais um ciclo da minha carreira estava a chegar ao fim. Acabava contrato em Junho, saindo agora teria mais tempo para encontrar clube. Eu e o Benfica temos que estar contentes por ter sido assim. A sua condição de suplente estava a incomodá-lo? Sempre estive com dignidade em todos os clubes, não queria que fosse diferente agora. Então, não deixa a Luz com mágoa? Não, pelo contrário, fui sempre bem tratado. O Benfica é um clube fantástico, e as pessoas que o dirigem são de grande profissionalismo, merecem o melhor. E com os adeptos está triste, já que os assobios têm sido frequentes? Eu aceito todas as críticas, são opiniões. Para mim, os assobios significam que os adeptos acham que tenho valor para fazer mais... isso é que é importante. Gosto dos assobios, uma notícia má chega sempre mais longe do que uma boa. Na pré-temporada prometia uma das suas melhores épocas. Estava em forma e marcava, mas isso desapareceu... Não desapareceu nada. Comecei bem, tal como na pré-época. Marquei o golo ao Anderlecht, mas depois veio aquele jogo de Bruxelas, que me desiludiu muito. Naquela altura estava muito bem física e psicologicamente, não havia jogador na Europa que se tivesse apresentado ao trabalho assim tão bem. Não compreendo as decisões... Refere-se à segunda mão da terceira pré-eliminatória da Liga dos Campeões que o Benfica perdeu por 3-0, e Zahovic foi suplente? Sim é esse jogo. Eu fui decisivo na primeira mão e depois, no segundo jogo, não fui titular. É muito difícil de compreender, dizem-me que tenho de compreender, mas... O técnico deu-lhe alguma explicação? Nunca falo com os treinadores sobre as suas opções. Mas aquilo mexeu comigo, não sou nenhum miúdo, tenho uma carreira já feita... Aquele era o jogo mais importante da época para a equipa, que podia dar um passo em frente, ir à Liga dos Campeões, em vez disso deu um passo atrás, foi para a UEFA, sempre a Taça UEFA. Esse jogo marcou a sua época? Sim sem dúvida. Pensava que iria fazer a melhor época, que a equipa iria finalmente explodir, e depois saíram os jogadores que estavam em melhor forma. O que é que se pensa nessa altura? Que não temos qualidade... É claro que fiquei afectado, quando uma pessoa não se sente importante, a cabeça não funciona e o talento fica reprimido. A rescisão é consequência do que se passou? Sim, esse jogo marcou tudo. Mas a época ainda não acabou, ainda podemos ser campeões, ganhar a Taça e estamos na UEFA. Como foi sua relação com Trapattoni? Normal. Despediu-se dele? Sim. Somos profissionais. Desejei- -lhe todas as felicidades do mundo, que fosse campeão, nada mais. Com Camacho também foi assim? Camacho é bom treinador, tem uma personalidade muito forte e como pessoa é quase o ideal. Trata os jogadores todas da mesma forma, quer estejam a jogar ou não, isso é importante. Gostava muito dele, tivemos um relacionamento espectacular. Trapattoni é assim... um pouco mais distante.