Mantorras: «Volto em Outubro»

Submitted by Ben on
Fonte
Record
O avançado do Benfica está na última etapa da recuperação. Sacrificou-se pelo “amor ao clube”, mas não se arrepende e só pensa em regressar aos relvados, no seu estilo próprio Record – Para quando é que está agendada a sua reintegração no grupo de trabalho? Mantorras – A meio de Outubro devo regressar à equipa, mas é possível voltar ainda mais cedo. O António Gaspar já disse que não me queria ver mais aqui depois desta data. Felizmente já não sinto aquela dor no joelho direito que me chateou tanto. Nos últimos tempos, nos treinos, tenho feito mudanças bruscas de direcção e remates, sempre sem quaisquer problemas físicos. Agora sinto que só faltam dias! Pelo que já passei no último ano e meio, um mês para mim não é nada. Vou voltar à competição e dar muitas alegrias aos sócios. Em casa tenho um calendário onde assinalo os jogos. Falta-me marcar o do regresso. R – Que diferenças sentiu entre esta recuperação com o António Gaspar e as anteriores que realizou? M – Este trabalho foi muito mais sério. O António Gaspar chegou a passar 24 horas por dia comigo, dando-me a força que necessitava. Houve alturas em que pensei que não voltaria a jogar, mas felizmente tive muitos amigos que nestes oito meses de calvário me ajudaram bastante. Neste período de tempo, além do prof. Gaspar, o Luís Filipe Vieira e a sua família, bem como o meu empresário, Jorge Manuel Mendes, nunca me deixaram abater nos momentos mais complicados. Sofri muito nos últimos meses e chorei bastante, mas agora é com muito alívio que chuto sem problemas e sinto os músculos desatrofiados. Vou recomeçar e mostrar a todos os que não acreditavam na minha recuperação que estavam errados. Muito em breve vou voltar a estar com os meus colegas. R – Em algum momento chegou a equacionar, interiormente, abandonar o futebol, devido aos sucessivos problemas no joelho direito? M – Houve uma altura em que tinha medo de tudo o que fazia. Nem eu próprio acreditava que ia voltar a jogar futebol. No início da recuperação queria correr e não me lembrava de como o fazer. Tinha receio de colocar o pé no chão. Nessa altura, o António Gaspar chegou ao pé de mim e disse-me que tinha de voltar a aprender a fazer tudo de novo, como um bebé. Esta frase marcou-me e foi isso que fiz. Devagar, passo a passo, prossegui a recuperação. Neste momento é que a motivação dos meus amigos foi imprescindível. Às vezes, depois de certos exercícios, estava em casa e à uma hora tocava o telemóvel. Era o António Gaspar a perguntar como é que me estava a sentir. Nunca vou esquecer este apoio. Graças a Deus está tudo a terminar. R – O seu sofrimento terá começado com uma recuperação acelerada para poder alinhar contra o Sporting. Concorda com esta análise? M – De facto, nunca mais fui o mesmo jogador desde então, pois alinhava sempre com o joelho inflamado. No entanto, não podia parar, uma vez que estávamos a tentar lutar por um lugar na Taça UEFA e fiz tudo que pude pelo grupo de trabalho. Entrei muitas vezes em campo com dores. Era poupado durante a semana e só realizava os dois últimos treinos. Mesmo assim, o joelho ganhava líquido. No entanto, não me arrependo das opções que tomei, pois quando o fiz foi por amor ao clube. A pressão era enorme e eu queria dar tudo, pois tinha 20 anos e estava no meu primeiro ano de Benfica. Por este motivo, aceitei sempre jogar quando me pediam. Lembro-me do encontro com o Marítimo, na época 2001/02. Precisávamos de ganhar para garantir o lugar na UEFA. Nem conseguia dobrar o joelho, mas entrei porque sabia que a equipa precisava. Era o tudo ou nada para nós. Mesmo nestas condições marquei dois golos, mas foram insuficientes, pois perdemos por 2-3. Depois, no balneário, soubemos que o FC Porto tinha vencido em Paços de Ferreira e alcançado o lugar na Taça UEFA. Chorei muito, não tanto pela dor em si, mas por não ter atingido os meus objectivos. Não estava habituado a essa situação. R – Hoje em dia tomaria outra decisão se lhe pedissem para jogar nas mesmas condições? M – Não aceitava. No entanto, o conhecimento que hoje tenho só o adquiri através da minha experiência pessoal. Na altura, como já disse, tinha 20 anos e como qualquer jogador só pensava em alinhar no próximo desafio. A pressão era muita e não queria desiludir ninguém. A situação que mais desilude um jogador é não poder fazer aquilo que mais gosta: jogar à bola. A situação mais frustrante que vivi nos últimos tempos foi não poder dar uns pontapés na bola. Custa mesmo muito. Foram semanas seguidas de trabalho físico em que só fazia ginásio e corrida. Estar a ver os colegas a jogar e não podermos fazer o mesmo é a pior situação. R – Como antevê o seu regresso à competição que, muito provavelmente, já será no novo Estádio da Luz? M – A minha prioridade é voltar com a mesma humildade. Tenho o meu estilo próprio e não vou “fugir” em campo. As lesões são fases pelas quais todos os atletas passam. Quero jogar bom futebol e estar à altura do novo estádio. O principal objectivo é voltar a dar muitas alegrias aos sócios do Benfica. R – No velho estádio certamente fica-lhe na memória o jogo com o Vitória de Setúbal onde alcançou uma exibição de sonho... M – Normalmente lembram-me esse jogo, mas com a camisola do Benfica houve um que marcou muito mais. Aquele jogo na Madeira com o Marítimo que já referi e em que entrei em campo limitado. Perdemos, mas foi uma prova para mim mesmo. Entrei com muita fé e marquei dois golos mas, sobretudo, foi uma lição que dei a mim mesmo. R – Mais uma vez o Benfica parte como um dos principais candidatos ao título. Acredita que o objectivo vai ser atingido este ano? M – Não vai ser fácil, mas no Benfica o objectivo é ganhar sempre. Estou certo que todos queremos vencer, mas não podemos dizer isso. Temos de respeitar os adversários e encarar todos jogos que disputarmos como autênticas finais. Para mim, os confrontos mais difíceis são contra as equipa pequenas e é por isso que defendo que temos de trabalhar sempre com a mesma humildade, seja contra quem for. No final será campeão quem errar menos. Pelo menos é esta a minha opinião. O mais importante é chegar sempre ao fim com os pontos em disputa conquistados. Ao logo da época temos de ir pensando jogo a jogo. R – Finalmente, este ano o Benfica conseguiu regressar às competições europeias. Como antevê a sua estreia nas competições da UEFA? M – Como é óbvio, só me passa pela cabeça disputar esta competição. É o sonho de qualquer jogador de futebol e eu não fujo à regra. O ideal seria ganhar as duas competições, a Taça UEFA e o campeonato. Pessoalmente confesso que prefiro alinhar nos jogos mais difíceis. O principal é nunca ter medo e entrar no relvado com vontade de ganhar, sem receios, seja contra quem for, mas sempre com humildade. Isto é essencial para conseguirmos o sucesso. R – Antes do seu regresso, a equipa ainda vai ter dois confrontos cruciais para a época. Nas Antas, com o FC Porto, e em Charleroi, frente ao La Louvière. Quer aproveitar e deixar alguma mensagem aos seus colegas? M – A melhor mensagem que lhes posso deixar é um voto de confiança. Estamos muito fortes e estou certo que vamos alcançar resultados muito positivos ao longo desta temporada. Até regressar e poder ajudar, a única coisa que consigo fazer é torcer por eles. Vão ser dois encontros muito complicados, mas acredito que vamos alcançar bons resultados. Acima de tudo, é preciso terem muita coragem. «Não consigo assistir aos jogos do Benfica» R - Mesmo lesionado. esteve ao lado de Nuno Gomes a assistir aos jogos do Benfica na Liga dos Campeões. Como se sentiu? M - Sinceramente, não gosto de ver os jogos do Benfica na bancada. Sofre-se muito. Aliás, nem pela televisão consigo acompanhar os encontros. Posso começar a ver, mas tenho de me levantar e ir dar um passeio. Só quero saber o resultado no final e, se possível, comemorar. É muito mais difícil ficar de fora, pois no relvado os nervos desaparecem quando começamos a disputar o encontro. Entramos para dentro de campo e fazemos o que de facto gostamos. Isso é fundamental. Nos dois jogos com a Lazio, com o nervosismo inerente à partida, cheguei a pontapear as cadeiras que estavam à minha frente. De facto, a vida de adepto não é nada fácil. Consegui sentir o mesmo que os sócios. R - Depois do encontro com o Belenenses segue-se o jogo com o FC Porto. Também vai às Antas ver o desafio? M - Não tenciono ir. Sofro muito. Gosto demasiado do clube e emociono-me muito durante o encontro. Prefiro saber o resultado no final. R - Como lhe pareceu a equipa do FC Porto frente ao Sporting? M - Não gosto de falar dos outros. Só me interessa o Benfica. «Federação angolana tem de ser intransigente» R - A sua outra paixão, a selecção de Angola, voltou a falhar a qualificação para a CAN. Faltam valores? M - Não. Felizmente não faltam valores. O que falta à Federação Angolana de Futebol é outra organização. Muitas vezes os jogadores que estão na Europa, em pleno Inverno, chegam a Luanda dois dias antes dos jogos e têm de adaptar-se a temperaturas muito altas. É óbvio que desta forma o nosso rendimento seja afectado. A federação tem de ser intransigente na defesa dos interesses da selecção como é por exemplo a dos Camarões ou a da Nigéria. Aí os jogadores apresentam-se muitos dias antes e os resultados estão à vista. Depois ainda há os problemas logísticos. As deslocações em África são sempre complicadas e por vezes não temos o tempo necessário para nos prepararmos. R - O Mundial de 2006 na Alemanha é um sonho concretizável? M - Temos uma grande selecção, mas é preciso dar continuidade ao trabalho entretanto já feito. Há talento suficiente e qualidade, mas só isso não chega. Todos nós desejamos estar presentes no Mundial. A Federação angolana tem de começar a pressionar os clubes para nos libertarem mais cedo.