A tarde em que a mística matou saudades na Luz...

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Outrora duros e intratáveis para os avançados adversários, Mozer e Ricardo Gomes deram um cúmplice abraço até não poderem mais e selaram com um beijo no rosto o reencontro. «Meu Deus, precisava de uma semana para colocar a conversa em dia...», desabafava Ricardo Gomes, sem saber para onde se virar tantas as caras que se cruzavam no seu caminho, outrora cúmplices companheiros de armas, sacerdotes de um espaço sagrado a que se chama balneário e que só quem o cheirou até às entranhas sabe o que significa este reencontro. Honrar o passado O Benfica decidiu juntar mais de centena e meia de campeões e prestar-lhes a devida homenagem, no fecho das festividades do centenário. Juntou-os no Estádio da Luz, palco de sonhos e de futuro, para um almoço de confraternização e entrega de lembranças. Tal como Ricardo Gomes e Mozer, muitos foram os encontros, anunciados quase sempre por uma sonora gargalhada, por abraços do tamanho de um mundo sem medida, por vozes exaltadas, por sorrisos que resultam, acima de tudo, de um estado de alma. O Benfica decidiu juntar mais de centena e meia de campeões e prestar-lhes a devida homenagem, no fecho das festividades do centenário. Juntou-os no Estádio da Luz, palco de sonhos e de futuro, para um almoço de confraternização e entrega de lembranças. Tal como Ricardo Gomes e Mozer, muitos foram os encontros, anunciados quase sempre por uma sonora gargalhada, por abraços do tamanho de um mundo sem medida, por vozes exaltadas, por sorrisos que resultam, acima de tudo, de um estado de alma. Naturalmente, os convidados foram-se juntando conforme as afinidades de cada um. Um dos grupos mais divertidos foi o dos vencedores da Taça Latina, a primeira grande conquista internacional do Benfica. Homens como José Bastos, Joaquim Fernandes, José Corona, José Rosário, Raul Pascoal ou Rogério Pi-Pi. Pai, filho e Espírito Santo Os campeões europeus também não se fizeram rogados na hora de algumas saudáveis picardias. Coluna não perde a oportunidade de se meter com o miúdo. Falamos de Eusébio, pois claro, que retribui com genuina reverência, tal como se de pai e filho se tratassem. De resto, ao lado destes estava Espírito Santo e até os mais ortodoxos em matéria de religião não se incomodarão por alguém se ter lembrado, vendo este trio junto, da Santíssima Trindade. Mais tarde, enquando Espírito Santo e Pedro Henriques conversavam, tudo fazia sentido: de um lado o mais antigo futebolista do Benfica ainda vivo, do outro o mais jovem campeão, ainda em actividade, na Académica. Porque entre ume outro uma mística tricotada a ouro, gerações de homens que se dedicaram de corpo e alma ao Benfica, tantas conquistas, tantos troféus, tantos sonhos. Para sermos justos, a geração dos últimos campeões pelo Benfica era talvez a mais animada. E não foi difícil perceber que as cumplicidades que ontem se viveram, e que nem os próprios conseguirão explicar, só podem resultar da união que, o passado, se tornou elo que o tempo não foi, nem será nunca, capaz de quebrar. E talvez nos sorri intimidades, nos segredos e nos códigos que só eles percebem resida, afinal, uma das razões pelas quais o Benfica ganhou tudo o que havia para ganhar. Os homens também choram Eles vieram de todos os lados. De terras de Sua Majestada chegou John Mortimore. «Até chorei quando recebi o convite.» Chorou mister? «Chorei, tal a emoção. O que sinto? Nem sei que palavras escolher», frisou. Em inglês, que o português está «enferrujado».E reforçou: «Este convívio, este encontro com amigos que não via há tanto tempo, é algo de absolutamente inolvidável », reforçava. E o que faz mister? «Jogo golfe, descanso um pouco. Ah... E fizeram-me presidente do Southampton, depois da morte do presidente.»E riu-se, nada condizente com a fleuma britânica, antes de cumprimentar Alberto, que Carlos Manuel lembrou ter sido autor de uma lesão no treinador inglês. Do Brasil chegavam Ricardo Gomes, William e Isaías. Da Suécia Schwarz e Mats Magnusson, que parecia um miúdo. «Eu adoro a Suécia mas o que eu gosto mesmo é do Benfica e de Portugal », desabafava. As lágrimas bailavam nos olhos de homens de barba rija. Toni emocionava-se ao falar dos que já partiram e daqueles que, tendo servido o Benfica, estavam em dificuldades. Basta abrir os olhos, alertar e lançou o repto para a ajuda. Humberto Coelho falava de «um dos grandes momentos » da sua vida, depois de ter reencontrado gente que não via há tantos anos. E revelava a chave do seu Benfica, do Benfica de todos os que estavam naquela sala: solidariedade. «A mística não morreu, mas está adormecida. É preciso recuperar essa alma. Inflamar os próprios benfiquistas. A paixão está adormecida, é necessário acordar o mais rapidamente possível», desabafava Humberto Coelho, entusiasmado, olhando para o lado e sentindo em todos aqueles campeões a razão de ser de uma mística que não pode morrer. Rosas, eclectismo, Macarrão e crianças Da mais de centena e meia de homenageados, nem todos eram ex-jogadores. Manuel Damásio e Ferreira Queimado representavam os ex-presidentes. Águias de Ouro e de Prata também eram muitos.O passado glorioso do Benfica também se fez no feminino, com entrega de medalhas a ex-atletas. Por ser um clube ecléctico, a mística passou também pelas modalidades, como o basquetebol, o atletismo, o râguebi, o hóquei ou o voleibol. E se alguém quiser saber o que é mística, pode também perguntar a Joaquim Macarrão, o mais antigo funcionário do Benfica. Houve também tempo para Luís Filipe Vieira lançar as linhas programáticas para «mais 100 anos de glória ». Para se evocar figuras que, para quem acredita, só em espírito puderam marcar presença no almoço. A última imagem que fica é a das crianças das escolas do Benfica e os jovens dos sectores de formação convidados para o almoço.Tantas vezes nos questionámos se perceberam o alcance de tudo o que se passou ontem na Luz. Podem nem ter percebido, mas sentiram.E respiraram essa mística que neles é depositada por quem, no passado, levou o Benfica aos quatro cantos do mundo. Assim a saibam honrar.