As luzes e sombras de Laurent Robert

Fonte
A Bola
Trinta anos. Para um jogador de futebol, há quem acredite que é esta a chamada idade da razão. Talento puro do futebol francês ultramarino, Laurent Robert é, para quem gosta de jogadores imaginativos e rebeldes, um daqueles clássicos casos que, quase enigmaticamente, causam durante os noventa minutos uma sucessão alternada de sentimentos opostos. Basta ver a forma como domina a bola com o seu pé esquerdo, assume o jogo, incute-lhe velocidade, encara o adversário e parte para o ataque para se perceber que está ali um jogador com genuína casta criativa. Atitude combativa aliada à qualidade técnica que, sem ser um monstro físico, fazem dele um avançado muito difícil de marcar. Nem sempre, porém, o mundo, como os jogos de futebol, são feitos à nossa medida. É nesses momentos que, sem razão perceptível a olho nu, o talento de Robert se apaga, pede a paciência e escapa-se do jogo como areia fina entre os dedos. Será uma questão de estrutura mental para superar defesas mais astutos ou menor capacidade de adaptação a sistemas tácticos que lhe retirem liberdade de criar? Agora, numa idade em que atinge a maturidade táctico-técnica, é tempo para o seu génio ganhar uma moldura mais cerebral. Estará aqui a chave para o talento domar o temperamento. O estilo de Laurent Robert Preferindo sempre jogar de fora para dentro, isto é, da linha lateral para zonas anteriores, a sua posição preferencial é como extremo-esquerdo. Foi nesse lugar que fez as melhores exibições, embora também possa actuar como médio centro ofensivo no eixo da segunda linha do meio campo, a chamada zona de criação e construção. Mais do que construir, Laurent Robert gosta de criar. Parece o mesmo, mas não é. A diferença reside, desde logo, em não ser, por natureza, um organizador de jogo. É, antes, um desequilibrador. O tipo de jogador que gosta de arrancar com a bola, embora sem ser percorrer espaços demasiado longos, e procurar, depois, com imaginação, definir as movimentações atacantes nos últimos 25/30 metros. Nesses movimentos, tanto procura cruzamentos tensos para a área e, numa das suas manobras preferidas, busca zonas interiores vazias para soltar o seu potente e colocado remate de meia distância com o pé esquerdo. A aventura em Inglaterra Ao longo de uma década, despontou no Montpellier, passou pelo PSG e, por fim, assentou no futebol inglês. O jogo de Robert ganhou então maior robustez física. A base genética manteve-se, porém, sempre a mesma. O treinador que provocou a sua ida para Inglaterra foi Bobby Robson, no início da época de 2001/02, numa altura em que o enfant terrible Robert se tinha definitivamente incompatibilizado com Luiz Fernandez, então técnico do PSG. No Newcastle, inserido num estilo de jogo aberto e sempre em velocidade, encontrou o habitat e o ritmo perfeito para o seu futebol. Sem grandes preocupações defensivas, limitava-se a definir na fase atacante. Solto, o seu pé esquerdo encantou os relvados ingleses. Metendo velocidade e imaginação por entre o jogo mais directo da generalidade das equipas britânicas, fez a diferença com a qualidade dos seus cruzamentos enroscados. Exímio a cobrar bolas paradas, tornou-se uma referência a marcar os cantos. Fazia a bola descrever uma curva que parecia fugir aos defesas e, como se fosse teleguiada, ir sempre ter com os avançados. Uma precisão que também emergiu na marcação de livres, na cobrança dos quais fez quatro golos a época passada. Acabaria por ser, mais uma vez, a irregularidade das suas exibições a comprometer a definitiva consagração do seu talento. Incompreendido por Souness, acabaria emprestado ao Portsmouth… Onde poderá encaixar no actual Benfica? Vendo o actual Benfica, esquematizado num 4x2x3x1 com dinâmica de 4x3x3, com a subida dos alas-extremos, ou 4x4x2,comasentradasdetrás de um segundo avançado muitas vezes disfarçado de playmaker (Nuno Gomes),um jogador como Laurent Robert está claramente feito à medida para encaixar na faixa esquerda. Outra opção seria colocá-lo no centro, mas falta-lhe vocação de organizador e, por preferir sempre um ritmo mais alto, capacidade para pensar o jogo nessa posição. Mas onde poderá ser uma verdadeira pedra preciosa para Ronald Koeman será na marcação de livres, do qual é um grande especialista. Quando sai do seu pé esquerdo a bola parece ganhar vida própria rumo à baliza adversária…